por Marcio Ornelas
Pro Dia Nascer Feliz é
um documentário de 2006, dirigido por João Jardim, que aborda a situação das
escolas e da educação brasileira, traçando um recorte social para mostrar as
diferentes realidades que podemos encontrar num país com vasta desigualdade. No
centro da narrativa estão alunos e professores, discutindo seus sonhos,
projetos e perspectivas.
O filme já é um
clássico para se debater a educação brasileira, muito utilizado em salas de
aula de ensino fundamental e superior. O grande acerto do filme, reside na
preocupação de humanizar o debate educacional, afinal, não estamos falando somente
da precariedade de prédios, da ausência de materiais adequados, da falta de
condições de trabalho. Estamos fundamentalmente, discutindo as consequências de
todos esses problemas nas vidas das pessoas que compõem o cotidiano escolar,
trajetórias inteiras que são delimitadas por essa relação. Portanto, não é
necessário perder minutos eternos enfatizando as diferenças estruturais que
existem entre uma escola pública de Duque de Caxias e uma tradicional escola
particular de São Paulo. Bastaria dar voz aos indivíduos e todo o abismo
existente saltaria a tela.
Quando são apresentadas
as diferentes perspectivas dos alunos, é onde o filme realmente consegue
chocar. De um lado, vemos alunos calejados por uma realidade de absoluta
pobreza e violência, onde por vezes os referenciais são os poderosos
traficantes da região. Os planos são simples tal como o cenário impõe: não
repetir de ano, ganhar meu próprio dinheiro, não sair da banda ou passar logo
pela escola. Não há uma perspectiva mais ampla, as condições não permitem. A
tristeza com a qual uma aluna, depois de formada, descreve a sua própria vida,
é muito devastadora. A escola não consegue se apresentar como um espaço capaz
de romper com a lógica conformista, de apresentar uma saída, de ser combustível
para lutar por transformações. Ao contrário disso, todas as decepções e
desilusões se consolidam lá. Do outro lado, temos alunos com toda a assistência
da escola, dos pais, desfrutando de um ambiente vivo em sonhos. Vivendo a
dificuldade de se estudar numa escola muito exigente, num ritmo de estudos
quase militar. Os planos de passarem para as melhores universidades do país e de
construírem carreiras brilhantes, servem de sustentáculo diante de toda a
pressão que sofrem.
O professor, em nenhum
momento da projeção, surge como um herói, como um ser que será capaz de
remediar a crítica situação do ensino brasileiro. Ao invés disso, ele aparece
cansado, desgastado, desacreditado por remar contra a maré por tanto tempo.
Como ser humano ele sofre junto com os alunos, enquanto emprega seus últimos
esforços, para ainda assim, ver a escola definhar. O professor tem de ser parte
da transformação do ensino brasileiro, mas é um fardo pesado demais para a
categoria carregar sozinha. A luta em defesa da educação é da sociedade, esse é
o grande desafio. O filme ainda tem a sensibilidade de abordar um tema, cada
vez mais comum entre professores, que é a necessidade de acompanhamento
psicológico. Sintomas que se manifestam na falta de vontade de comparecer ao
local de trabalho, no rendimento das aulas e que levam frequentemente a
depressão, tudo em decorrência do ambiente estressante que enfrentam todos os
dias.
Passados sete anos, o
documentário permanece absolutamente atual. Pena não poder relatar qualquer
avanço na melhoria do ensino público nesse tempo. Não podemos aceitar um
projeto pedagógico que veja o professor e o aluno de escola pública, como um
estorvo que deve ser combatido. Temos o direito a uma escola pública de
qualidade, a um ensino libertador. Temos o dever de lutar por isso, não é
fácil, mas por certo não estamos entregues.
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Marcio Ornelas, 23 anos, professor de geografia. Militante do coletivo Juntos! e secretário de juventude do PSOL São Gonçalo/RJ.
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